agravam-se as assimetrias de investimento do MC nas artes

Foi com bastante preocupação que tomámos conhecimento do aviso de abertura relativo aos procedimentos para apoio directo e indirecto às artes.

Ao longo dos últimos anos a PLATEIA tem tentado sensibilizar o Ministério da Cultura para o carácter iníquo da situação gerada pelos procedimentos de apoio às artes abertos em 2004: Procedimentos em que a região Norte, e apesar das correcções ao aviso de abertura, foi negativamente discriminada, sem que para isso existisse qualquer justificação de carácter político.

Posteriormente o DL 225/2006 de 13 de Novembro (na alínea b) do seu nº 3, ainda em vigor) afirmava a correcção de assimetrias regionais como um dos objectivos da nova política de apoio às artes. E ainda há poucos dias, mesmo antes do presente aviso de abertura, o preâmbulo da Portaria 1204-A/2008 de 17 de Outubro afirmava pretender operacionalizar “a distribuição equilibrada da actividade artística pelas diferentes regiões e o acesso à fruição das artes pelos diversos públicos”.

Ficámos naturalmente estupefactos quando, após a declaração destas melhores intenções políticas e preambulares, fomos confrontados com números que traduzem uma actuação da administração ao arrepio dos compromissos políticos assumidos em Diário da República.

De facto os cidadãos portugueses que habitam a Região Norte do país continuam a ser tratados, pelo actual executivo, como sendo de segunda categoria, quer enquanto agentes culturais e artísticos, quer enquanto público. Senão vejamos, e considerando só os números relativos às artes do espectáculo (teatro, música, dança e cruzamentos disciplinares):

- Quanto ao investimento por habitante: Em 2007/08 o investimento por habitante na Região Norte era o mais baixo de Portugal: 0.88 € contra, no limite, os 3,07 € da Região de Lisboa e Vale do Tejo. E surpreendentemente em vez deste fosso ser corrigido ele é ainda mais acentuado pelo actual aviso de abertura: A Região Norte permanece afundada na cauda do país com 1,04€ de investimento por habitante enquanto Lisboa e Vale do Tejo sobe para os 3,43 € por habitante.

- Quanto ao número de habitantes por estrutura: Em 2007/08 a Região Norte apresentava cerca de 100 000 habitantes por estrutura financiada. Esta situação mantém-se em 2009/10. Também neste índice a Região Norte se apresenta na cauda do país, pretendendo-se que aqui existam três vezes mais habitantes por estrutura do que na região de Lisboa e Vale do Tejo (97 156 contra 33 105)

- Quanto aos índices de crescimento das estruturas apoiadas: O presente aviso de abertura pretende apoiar 38 estruturas na região norte (mais três que nos anos anteriores, ou seja um crescimento de cerca de 10%)). Mas na Região de Lisboa e Vale do Tejo serão apoiadas 82 estruturas. Mais treze que nos anos anteriores (Ou seja um crescimento de cerca de 20%). E mais uma vez também aqui a Região Norte se encontra na cauda do país, em face dos crescimentos entre 30% e 50% das restantes regiões.

Como explicar esta distribuição de recursos em face das orientações legislativas em vigor?

Como aceitar que a definição das políticas do sector (e a afectação de recursos são o mais nítido reflexo dessas opções políticas) seja ditada por critérios que insistem na manutenção de um status quo nada equitativo?

Como compreender um modelo de desenvolvimento que repete os erros do passado e propõe um crescimento que não só não corrige as assimetrias como chega ao absurdo de as agravar, vedando à Região Norte a possibilidade de um crescimento convergente com o resto do país?

Senhor Director Geral, o presente aviso de abertura não persegue as orientações políticas assumidas pelo executivo pois não vai no sentido da correcção das assimetrias regionais, antes pelo contrário, cava mais fundo as desigualdades entre os cidadãos portugueses.

E esta situação é particularmente notória na área do teatro onde novamente as estruturas da Região Norte se debatem com os mais baixos montantes médios de financiamento e onde o número máximo de candidaturas a apoiar não permite a inclusão de todas as estruturas que desenvolvem a sua actividade de forma regular, anual e profissional.

Assim teremos que estes montantes médios de financiamento irão provocar a continuação do estrangulamento económico do sector: Para corresponder às necessidades das estruturas de maior dimensão orçamental será preciso lançar as de menor dimensão para patamares de sub-financiamento neste tipo de concurso (ou seja montantes que não permitem um desenvolvimento continuado e profissional da actividade). E para impedir este tipo de sub-financiamento será necessário baixar os patamares máximos de apoio provocando um sub-financiamento das estruturas de maior dimensão, cortando-lhes um horizonte de crescimento que fica apenas reservado para o resto do país. E de uma forma ou outra, estaremos sempre a não contabilizar várias candidaturas de estruturas que deveriam ter espaço neste tipo de financiamento, o que, como sabemos, gera normalmente reacções que descredibilizam publicamente a política para o sector e, tantas vezes, acabam em processos judiciais cautelares, paralisantes da actividade económica e artística. Situação que se agrava por obrigar essas estruturas a candidaturas a apoios pontuais, ocupando assim um espaço de financiamento que deveria ser reservado às gerações mais novas, e colocando em perigo os normais ciclos de renovação do tecido artístico e económico.